
Foto: Fredrik Karlsson
Do Velho Mundo 2024-25 #1 – O melhor e pior do hóquei europeu até agora
Esta é a coluna chamada Do Velho Mundo, um projeto antigo meu para abordar o hóquei do continente europeu, também conhecido como o velho mundo – vindo daí o nome da coluna. Do Velho Mundo foi uma coluna ativa em outras praças entre 2015 e 2022, sempre falando de assuntos sobre o hóquei europeu, fosse o melhor, o pior, o diferente, o preocupante, o assunto sério… Em resumo, de tudo um pouco. E após dois anos de hiato, voltamos para continuar esse projeto que consegue ser sério, caótico, estranho… Resumindo, de tudo um pouco e, às vezes, de tudo um pouco mesmo e ao mesmo tempo.
E para quem não conhece o chamado hóquei europeu, aqui vai um breve resumo de como ele funciona:
A Europa é composta de cinquenta países, todos eles com suas próprias ligas nacionais de hóquei, ou não, já que tem micro-nações como Andorra e Vaticano nesta conta. Algumas ligas são diferentes, não sendo de apenas um país. Isso é o caso da Central European Hockey League que nasceu da fusão das ligas de Bélgica e Países Baixos. Mas para efeitos de coluna, no geral vamos focar mais em um grupo menor de ligas e nos torneios continentais. Foi esclarecedor o suficiente? Eu duvido, mas vamos abordar os pormenores com o andamento da temporada.
Para começar, vamos a uma questão importante a respeito da KHL:
KHL: Esta é a Nova Era?
A Kontinental Hockey League (KHL) é a liga que nasceu da antiga Russian Superleague e atualmente tem times da Rússia, Belarus, China e Cazaquistão. A KHL tem uma organização parecida com a NHL com duas conferências: Leste e Oeste. Além disso, contém quatro divisões homenageando lendas do hóquei soviético: Bobrov e Tarasov no oeste, Kharlamov e Chernyshev no leste.
Certas tendências esportivas aconteciam desde sua fundação em 2008. A conferência Oeste foi dominada por CSKA Moscou e SKA São Petersburgo, já a Leste teve AK Bars Kazan e Metallurg Magnitogorsk como os times mais constantes. A KHL costumava ser a liga mais previsível do hóquei europeu, com exceções acontecendo para provar a regra. Os times mais ricos dominavam a liga e esse foi um dos fatores para a KHL adotar um teto salarial, os outros estão ligados com rotatividade de equipes por fatores financeiros. O teto salarial da liga tem efeito não apenas financeiramente, mas também no competitivo.
Nessa temporada isso se reflete nos times que tem se saído melhor, pelo menos até agora. A conferência Oeste é dominada pelo Lokomotiv Yaroslavl, que costumava ser a terceira força há uns anos, na última temporada o Lokomotiv terminou foi o terceiro colocado na Conferência Oeste e foi até a final da liga, onde foi varrido pelo Metallurg Magnitogorsk. O objetivo do Lokomotiv é bem simples e claro: voltar a final e dessa vez vencer a Gagarin Cup. Com 60 pontos em 37 jogos o time não é apenas o melhor da sua conferência, como tem a melhor campanha da liga
Ainda no oeste, Spartak Moscou e Dynamo Moscou são respectivamente segundo e terceiro colocados. O Spartak tem 50 pontos e o Dynamo 47. São dois times muito tradicionais que passaram muito tempo longe do topo, mas desde a temporada passada mudaram o próprio paradigma.

O Spartak Moscou está em ótima fase (Foto: HC Spartak Moscou)
Na Conferência Leste, por sua vez, os melhores times são Traktor Chelyabinsk e Salavat Yulaev Ufa (e sim, esse é o nome da cidade-natal do Salavat Yulaev e não uma interjeição de alívio, ou a sigla para agente-livre irrestrito). Enquanto o Salavat Yulaev foi terceiro da conferência na última temporada, o Traktor vem de um sexto lugar e uma evolução após perder os playoffs em 2022-23.
Somando todos esses fatores, ainda assim falta algo importante para entendermos como a KHL aparentemente entrou em uma nova era. Times de cidades médias e menores têm conseguido competir melhor contra as potências como CSKA e SKA, que estão pagando caro pelos contratos multimilionários feitos há uns anos. O teto salarial da liga obrigou esses times a se reinventarem, não somente eles, porém os dois costumavam garantir os melhores jogadores do mercado oferecendo mais dinheiro e agora têm dificuldades logísticas de lidar com contratos antigos mais caros e continuarem competitivos.
Assim como aconteceu na NHL, na KHL a chegada do teto salarial marcou uma nova era. Agora, quatro temporadas depois, começamos a ver os efeitos reais e as portas para o futuro se abrindo. Se a KHL era a liga mais previsível do hóquei europeu, talvez essa pecha já não faça mais sentido.
Liiga: Tappara vs Todo Mundo
Nos últimos anos, o hóquei finlandês masculino foi dominado por um time chamado Tappara. Para quem não conhece, o Tappara é um time da cidade de Tampere fundado no distante ano de 1932. Sua trajetória é de muitos títulos, foram sete na era amadora do hóquei finlandês (1933-1975) e são 13 no período profissional (1975-presente), sendo 20 conquistas no total. Desses 20 títulos, os últimos cinco foram vencidos de 2016 para cá, com direito a tricampeonato em 2022, 2023 e 2024. E em 2022-23, o time ainda conquistou a Champions Hockey League (prestem atenção nesse nome!), o título continental principal do hóquei europeu, para ter o melhor ano de sua vida… Até agora, pelo menos.
É claro e indiscutível que o Tappara está vivendo uma nova era dourada e tem monopolizado o hóquei masculino finlandês. E quando algum time domina seu país, instantaneamente todos os outros times querem derrubá-lo e vão fazer o possível para isso.

O Tappara vem de anos seguidos conquistando títulos (Foto: Tappara Tampere)
A temporada virou uma disputa entre Tappara e todo mundo, todos os outros times. É uma disputa esportiva e limpa, são muitos jogos vencidos, ou perdidos, por uma margem mínima no placar. O Tappara é um time que tem dominado a posse do disco nos jogos e enfrentado defesas fechadas e pesadas, o que é até normal, mas parece haver um ânimo maior dos adversários em segurar o atual tricampeão da Liiga. Os três campeonatos nas últimas três temporadas não caíram do céu, mas toda a Finlândia está reunida em torno de um objetivo claro: impedir que o Tappara seja tetracampeão em anos consecutivos.
Isso traz um tempero diferente na temporada da Liiga, que é uma das melhores ligas do hóquei europeu. Por enquanto, Tappara está em quarto na classificação, atrás de SaiPa, HIFK e K-Espoo. Esse é um time muito forte e que pode vencer seu quarto título em quatro anos, mas aparentemente vai precisar se esforçar o quádruplo para conseguir isso.
DEL: A Disputa Para Ser o pior
Na Alemanha temos a Deutsche Eishockey Liga, a DEL, a liga que representa o nível um do hóquei masculino na Alemanha. Nem tudo são flores mesmo no mais alto nível, e, às vezes, o nivelamento por baixo pode criar uma competição emocionante e equilibrada para ver quem é o pior. Contextualização feita, vamos falar sobre os três piores times da DEL:
Em 12º lugar com 25 pontos em 26 jogos está o Augsburger Panther, um dos mais velhos e tradicionais times de hóquei no gelo da Alemanha. O Panther anda mal por alguns anos, na realidade terminou na lanterna na temporada passada e não apenas se viu fora da pós-temporada, como foi ameaçado pelo rebaixamento, assunto que vamos falar melhor depois. Na temporada atual o time marcou 69 gols e sofreu 87, apenas dez dos jogadores já chegaram a marca de 10 ou mais pontos na temporada. Não é o pior dos times, mas precisa ficar atento com quem vem atrás.
Abaixo do Augsburg, está o Iserlohn Roosters na 13ª posição com 21 pontos em 26 partidas. Os Roosters (GALO[S]!) também têm andado entre os piores times da DEL nos últimos anos e, como o Panther, tem dificuldades em fazer o mais importante do jogo. São 60 gols marcados, 96 sofridos, apenas oito dos jogadores alcançaram a marca de dez pontos ou mais na temporada. Os quatro pontos de diferença para o Augsburger Panther parecem um problema enorme nesse momento porque Iserlohn tem sido um saco de pancada o ano todo.
Mas, até agora, o time que é o maior ponto grátis na DEL é o Düsseldorfer EG. Não muito pior do que os Roosters, Düsseldorfer tem 20 pontos nos 26 jogos disputados até agora, a diferença mínima foi uma vitória de Iserlohn na prorrogação contra nenhuma do Düsseldorfer. O time marcou 55 gols, apenas sete dos seus jogadores chegou a marca de 10 ou mais pontos, mas defensivamente o buraco é muito maior e muito mais embaixo. O Düsseldorfer EG sofreu 102 gols até agora, uma média de 3,92 gols sofridos por jogo, os coitados dos goleiros estão sendo massacrados por conta de um time fraco e ineficiente em toda a extensão do gelo. Na história do hóquei alemão, o Düsseldorfer é um dos maiores times e carrega uma história de muitos títulos e grandes momentos, mas a atualidade é diferente disso. Para quem é um dos maiores times da história do hóquei europeu realidade é o oposto da tradição do time de Düsseldorf, desde a última temporada ele figura entre os piores da DEL e o futuro parece muito sombrio para esse time.

O Düsseldorfer EG enfrenta muitos problemas nessa temporada (Foto: IMAGO/Fabian Friese)
O que Augsburger Panther, Iserlohn Roosters e Düsseldorfer EG querem evitar é terminar em último no campeonato. O pior time da temporada regular da DEL é rebaixado, ao menos tecnicamente, já que o rebaixamento na prática acontece apenas se o campeão da DEL2, que seria a segunda divisão, estiver aprovado DEL, já que a liga tem um sistema de controle muito forte das economias dos clubes para garantir que ninguém vá falir no meio da temporada, o que já aconteceu várias vezes e é um fantasma que ainda assombra os bastidores da liga. O Augsburger Panther mesmo se livrou do rebaixamento na prática na última temporada porque o campeão da DEL2 não pediu aprovação.
E qual as chances de um desses times terminar rebaixado na prática e ter que disputar a DEL2 na próxima temporada? Muito alta, vários times da DEL2 estão pré-aprovados para a licença da DEL na próxima temporada e a maior parte deles ocupa a parte de cima da tabela na temporada atual. A missão é simples, porém não fácil: não terminar em último. E, mesmo assim, alguém será o último colocado.
Champions Hockey League: A Busca Pela Glória do Hóquei Europeu
Todos os esportes têm sua Champions e o hóquei europeu não é diferente. Ela não é tão badalada e promovida como a do futebol, não tem tanto dinheiro, nem os maiores craques do esporte, em alguns lugares nem mesmo o povo. E, mesmo assim, a Champions Hockey League, CHL, é fantástica e tem uma magia própria que apenas um campeonato continental pode proporcionar, são os melhores times das melhores ligas da Europa, menos a KHL, disputando um torneio entre si. A CHL nasceu de uma iniciativa dos times, outros torneios continentais existiam e existem até hoje, mas eles criaram um modelo diferente do que era, tudo baseado é claro UEFA Champions League.
E essa temporada teve tantas histórias incríveis e únicas já, é forte candidata a ser considerada “A maior Champions de todos os tempos”(TNT SPORTS, Narrador do). Tudo começou em setembro com a temporada regular, cada time disputou seis jogos num calendário pré-determinado baseado no emparelhamento do sistema suíço de torneio, muito usado em torneios de xadrez, cardgames e esportes eletrônicos. Como destaques da temporada regular posso citar a campanha quase perfeita do Färjestad BK da Suécia com cinco vitórias no tempo normal e uma vitória na prorrogação, marcando 17 dos 18 pontos possíveis.
Outra bela história foi a do Lahti Pelicans, um time finlandês em ascensão que tem o famoso piloto Valtteri Bottas no quadro de sócios-proprietários. Os Pelicans terminaram em nono lugar com 11 pontos. Mas a grande história acabou sendo do Sheffield Steelers, o clube britânico foi o primeiro do seu país a conseguir uma vaga nas oitavas de final, jogou sempre com casa cheia e deu um ar especial ao torneio.
Nas oitavas de final o clima mudou, enquanto tivemos algumas goleadas, incluindo vitórias por 5 a 1 e 5 a 2 do Bremerhaven Pinguins, da Alemanha, contra o Skellefteå AIK, da Suécia. No entanto, tivemos duelos épicos até o fim, como do Färjestad contra o Tappara, que terminou com 6 a 5 para o Färjestad na somatória dos placares com direito a prorrogação. Väjxö Lakers, da Suécia, e Fribourg-Gottérron, da Suíça, também disputaram a vaga até o fim, os Lakers terminaram com 4 a 3 na soma das duas partidas.
Assim, o funil foi ficando mais estreito e nas quartas de final a CHL fechou o ano de 2024. Foram dois confrontos que terminaram com diferença ampla e dois mais disputados até o final, podemos e iremos destrinchar as séries para ficar claro o que aconteceu. Começando pela mais fácil: Genéve-Servette HC, o time suíço que é o atual campeão da Champions Hockey League, contra Bremerhaven Pinguins. O primeiro jogo foi a chave da classificação para o Genève-Servette com uma vitória por 4 a 0 em casa, no segundo jogo os dois times empataram em 2 a 2 e o placar total ficou 6 a 2 para o Genève-Servette sem sustos.
Olhando para a soma dos dois jogos, o Färjestad BK parece ter passado fácil pelo Red Bull Salzburg, da Áustria. Você vê 7 a 3 para o Färejstad e pensa que foi um passeio no parque, mas o contexto do confronto não foi tão fácil assim, podemos dizer que pelo menos metade dele não foi fácil. O jogo de ida em Salzburg teve vitória do Energético, também conhecido como Bragantino Austríaco, pelo placar de 3 a 1. O Färjestad entendeu que precisava de seriedade e concentração para virar o confronto e voou (não era o Energético que dava asas?) na volta, o jogo disputado em Karlstad foi 6 a 0 para os donos da casa com os jogadores do Färjestad mantendo a postura ofensiva mesmo com as dificuldades no primeiro período e depois de virar o placar agregado do confronto durante o segundo período.
ZSC Lions, clube da Suíça, e Eisbären Berlin, da Alemanha, fizeram duas partidas muito disputadas. No primeiro jogo, disputado na capital alemã, o time suíço levou a melhor vencendo por 4 a 3 de virada, a volta seguiu um roteiro parecido. Os Eisbären chegaram a abrir 3 a 0 no primeiro período, os Lions ensaiaram a remontada no segundo período com dois gols. Os visitantes chegaram a marcar o quarto gol no início do terceiro período, porém os donos da casa conseguiram se impor e marcaram três vezes. ZSC Lions 5 a 4 Eisbären Berlin no segundo jogo, 9 a 7 no placar agregado.
Mas nenhum confronto foi tão dramático quanto Växjö Lakers, da Suécia, contra Sparta Praha, da Tchéquia. Primeiro jogo disputado em Praga e os Lakers venceram por 2 a 1 levando a vantagem para casa. O jogo em Växjö, os donos da casa abrem 3 a 1 no placar, mas o Sparta não desistiu e empatou o jogo no período decisivo em 3 a 3. Os Lakers voltaram a frente do placar com menos de 5 minutos no relógio, mesmo com a desvantagem o Sparta continuou acreditando e empatou o jogo novamente. Foram 64 segundos para a virada do time tcheco com 1 minuto e 4 segundos no relógio levando o confronto para a prorrogação. E na prorrogação Jani Lajunen apareceu sozinho na frente do gol para desviar o disco, marcar seu segundo gol na noite e classificar o Sparta para mais uma semifinal de CHL.
O caminho para a final da maior Champions fica definido: de um lado Färjestad BK vs Sparta Praha, o Färjestad é favorito, no entanto o Sparta já mostrou espírito de luta para eliminar um time mais forte. A outra semifinal é o confronto suíço entre Genève-Servette HC e ZSC Lions, o Genève-Servette quer ser bicampeão, o ZSC quer chegar a sua primeira final. Quem serão os finalistas da CHL edição 2024-25? Em janeiro nós saberemos.
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