Mundial Masculino 2024: o melhor, o pior e o campeão

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Neste domingo, 26/05, terminou mais uma edição do tradicionalíssimo campeonato mundial organizado pela IIHF. Esse campeonato é ao mesmo tempo uma competição e celebração da temporada que está terminando, ele fecha o calendário da IIHF todos os anos e é um dos três títulos mais importantes do hóquei no gelo masculino ao lado da medalha de ouro olímpica e a Stanley Cup.

Para fazer a análise do que aconteceu vamos pegar emprestado o título do clássico do cinema O Bom, o mau, o feio (1966), Il buono, il brutto, il cattivo no original em italiano, como estrutura base da nossa análise geral sobre a competição e adaptar em O Melhor, O Pior e a Campeã.

Começando a análise pelo que aconteceu de melhor nessa edição do mundial:

 

Mundial Masculino / Suíça

(Reprodução: The Athletic)

O Melhor

A edição de 2024 foi disputada na Chéquia tendo as cidades de Praga e Ostrava como suas sedes. A Chéquia é um dos países mais apaixonados por hóquei no gelo nesse mundo, o esporte disputa o primeiro lugar em popularidade no país com o futebol, por isso é até natural vermos a torcida tão animada e presente em competições de todos os níveis. A presença e torcida na arena é sempre um ponto importante para se entrar no clima, e nisso os tchecos são sempre nota 10! E o fator de terem torcedores de outros países, proporcionado pela proximidade e facilidade de se viajar pela Europa, adiciona alguns pontos extras.

Falando agora esportivamente, a seleção da Áustria é um dos destaques do que se teve de melhor no mundial. O ponto principal é a evolução do hóquei austríaco, seguindo a onda centro-europeia iniciada por Suíça e Alemanha, que disputou sua terceira edição seguida na elite mundial e dessa vez foi até o final disputando uma vaga nas quartas de final. Porém, os Austríacos tropeçaram na última rodada contra uma já rebaixada Grã-Bretanha, assunto para mais a frente nesse texto, e perderam a chance de passar da primeira fase pela primeira vez em 30 anos.

Falando em Suíça e Alemanha, eu não sei o que os deuses do hóquei pensam e como o destino age, eu só sei que essas duas seleções parecem fadadas a se encontrar nas quartas de final das competições masculinas. Esse ano não poderia ser diferente, foi o terceiro encontro nessa fase desde o mundial de 2021, só em 2022 que elas não se enfrentaram. Em 2024, finalmente, a Suíça venceu a Alemanha num bom jogo mais uma vez, muito equilíbrio como é o costume deste novo clássico do hóquei de seleções. O placar final de 3 a 1 suado deu passagem para as semifinais ao selecionado suíço.

A Suíça que mais uma vez fez ótima campanha avançando para a semifinal contra o Canadá e terminando com o segundo lugar. É a segunda medalha de praça suíça no campeonato mundial masculino, o time tem muito para se orgulhar do que fez no gelo, mas ficou aquele gostinho de que podia ser mais. A Suíça vem demonstrando sinais de maturidade como país do hóquei no gelo competitivo no cenário mundial, apenas ainda não chegou ainda na maturidade necessária para conquistar um título. O bom trabalho continuando na formação de jogadores e treinadores, a hora da glória um dia chega para a Suíça também.

E terminando os destaques positivos, teve Kevin Fiala. Fiala terminou escolhido como o melhor jogador da competição, ele foi o segundo maior pontuador do torneio perdendo para Matt Boldy dos Estados Unidos nesse quesito. Fiala marcou 13 pontos, sete gols e seis assistências, foi votado como o melhor jogador pelos diretores do torneio, ele é o segundo suíço eleito MVP do mundial masculino. O primeiro foi Roman Josi, eleito em 2013, e o próprio Josi levou o prêmio de melhor defensor nessa edição.

Grã-Bretanha Mundial Masculino

(Reprodução: Andrea Cardin/IIHF)

O Pior

Mais um ano em que não tivemos Rússia e nem Belarus nas competições da IIHF, as duas seleções estão banidas pela invasão à Ucrânia. Elas vão continuar banidas pelo menos até maio de 2025 das competições, o que elimina Belarus completamente das eliminatórias para as Olimpíadas de 2026. As duas seleções estão banidas desde 2022 quando a Rússia invadiu a Ucrânia com apoio de Belarus, o que foi uma atitude inédita da federação e vista como sendo hipócrita já que países membros da OTAN como Estados Unidos e Canadá somente neste século já fizeram guerras de invasão no Afeganistão e Iraque, como comparação. As duas seleções, especialmente a Rússia, fazem falta no cenário internacional.

Indo para o esporte, a Grã-Bretanha foi uma decepção nessa edição. Quer dizer, relativamente falando, já que os britânicos entraram como um dos favoritos ao rebaixamento e foram rebaixados. A Grã-Bretanha passou muito fácil na divisão 1-A temporada passada, conseguindo a promoção para esse ano, caiu no grupo A e foi simplesmente amassada por todas as seleções. Na sexta rodada foi goleada pela Noruega na disputa direta e acabou tendo seu destino selado com uma rodada de antecedência. Os britânicos esperavam mais, talvez pelo menos poder lutar até o fim, mas a realidade foi muito mais dura do que as expectativas previam. Eles ainda conseguiram uma boa vitória no final, quando já não valia mais nada para a própria Grã-Bretanha.

Outro ponto negativo foi a campanha polonesa, de certa forma também. Os poloneses até conseguiram um pontinho na primeira rodada contra a Letônia, esse foi o máximo dessa seleção. Novamente, as expectativas polonesas não eram altas, mas a realidade foi difícil de se assistir. A Polônia terminou a competição com a pior eficiência ofensiva e power play, seu melhor pontuador foi Patrik Wronka, que marcou dois pontos, sendo duas assistências. Ninguém esperava muito da Polônia, precisamos ser francos, mas a seleção polonesa entregou menos ainda.

Avançando nossa lista de piores, chegamos aos Estados Unidos. Quem acompanha a seleção feminina e as seleções de base está acostumado a ver ótimos resultados dos EUA em competições internacionais, mas a seleção masculina principal é um caso à parte. É sempre o mesmo roteiro: Os Estados Unidos vão bem na primeira fase, mas aí chega às quartas, semifinal ou final e eles perdem. Esse ano não foi diferente, boa fase de grupos e então uma derrota por 1 a 0 para a Chéquia nas quartas de final, o que foi diferente é que o elenco estadunidense estava recheado de ótimos jogadores da NHL deixando tudo pior do que já era. Mas esses são os Estados Unidos no mundial masculino: jogam como nunca na primeira fase, perderam como sempre no mata-mata.

Depois de ótimos anos seguidos de títulos e finais, a Finlândia esse ano parecia completamente perdida e desorganizada no gelo. Os finlandeses até chegaram às quartas de final, empataram com a Suécia no tempo normal, mas uma penalidade na prorrogação levou os rivais nórdicos ao gol que eliminou a Finlândia. A Finlândia podia mostrar mais, jogar melhor, mas dessa vez parece que a vontade geral era só não fazer feio e ir embora o mais rápido possível. Se esse era o objetivo finlandês, parabéns, ele foi cumprido com sucesso.

E a própria Suécia fez um jogo abaixo na fase seguinte, não bastou a derrota teve humilhação. E, como já dito anteriormente, os Suecos em teoria tiveram maior volume de jogo, porém sem grande qualidade. Essa seleção sueca em específico não deveria terminar uma semifinal de mundial sendo goleada por 7 a 3, foi um jogo decepcionante em que os atacantes ajudaram a consagrar o goleiro tcheco Lukáš Dostál. A Suécia foi com um elenco muito qualificado, era uma das favoritas para o ouro, só faltou jogar o que deveria. Pelo lado bom, pelo menos a Suécia terminou levando a medalha de Bronze. Como diz o ditado: os exaltados serão humilhados, ou algo assim.

E já que falamos em exaltados sendo humilhados, chegou a hora de falar sobre o Canadá! A seleção que contava com John Tavares como seu capitão, Connor Beddard, Owen Power e vários outros jogadores muito bons caiu na semifinal, no shootout. Em alguns momentos da história o Canadá conseguiu vencer a disputa de penalidades contra seleções europeias em jogos eliminatórios, isso é a exceção da regra. É incrível como a seleção canadense desde 1998 falha em disputas de penalidade contra adversários da Europa. Dessa vez eles saíram atrás, tiveram que correr atrás de uma diferença de dois gols, tiveram power play na prorrogação, algumas situações de atacante cara a cara com o goleiro, e não conseguiram o gol. E então o sonho do ouro em 2024 termina do modo mais tradicional possível com a derrota no shootout, que é sempre um grande momento!

Mundial Masculino

(Reprodução: AP Photo/Petr David Josek)

A Campeã

 

Começamos esse texto citando o clássico do cinema O Bom, o mau, o feio ( Il buono, il brutto, il cattivo) e o ápice desse filme tem uma belíssima composição da lenda Ennio Morricone (1928-2020) como sua trilha sonora (fica a dica cultural de filme). É uma música muito adequada para falar sobre a seleção campeã do mundo porque se chama L’estasi dell’oro, mais conhecida pelo nome em inglês The Ecstasy of Gold, que significa simplesmente O Êxtase do Ouro. E aqui chegamos, ao êxtase do ouro no mundial masculino para falar da seleção campeã.

E o que falar da Chéquia, hein? Os donos da casa fizeram uma boa campanha boa o suficiente para passar pela primeira fase sem sustos. Nas quartas pelos Estados Unidos nas quartas, com direito a shutout, e chegaram à semifinal contra a então invicta Suécia. O resultado foi um jogo que poderia ser uma aula de hóquei no gelo, pelo menos da parte tcheca, deixando o adversário disparar a gol, mas sem grande qualidade facilitando o trabalho do goleiro. Lukáš Dostál terminou com 37 defesas, Martin Nečas marcou quatro pontos, um gol e três assistências, foi um grande jogo de ambos.

A final foi um jogo que começou lento, sem grandes chances, com os dois times muito atentos. No terceiro período veio o gol, finalmente. Ele saiu do stick David Pastrňák, recebendo um passe cruzado no círculo esquerdo e marcando o gol do título. Pastrňák até então não havia feito nada de muito interessante, entretanto o maior craque tcheco da atualidade apareceu na hora certa para fazer o tão necessário gol. A Suíça pressionou, então outra vez Lukáš Dostál apareceu ligado e fechou a porta, contando com a sorte um pouco também, mas a sorte também acompanha os bons goleiros. O gol de David Kämpf com 19 segundos no relógio na rede vazia confirmou o título mundial para os donos da casa.

Foi uma campanha irretocável na segunda fase por parte dos tchecos, Lukáš Dostál conseguiu passar pelas quartas de final e pela final sem tomar gols. Diriam que essa Chéquia sabe sofrer, isso pode ser verdade, mas acima de tudo ela soube confiar em si e fazer seu jogo dominando os adversários onde mais importa que é no placar final do jogo. O hóquei é um jogo com muitas maneiras de jogar, saber equilibrar ataque e defesa é a melhor resposta e nisso a Chéquia foi muito bem na sua campanha.

Torcida animada, hino tcheco, We Are The Champions tocando, taça erguida. Tudo muito clichê, nesse caso é um bom clichê digno Roteiro de cinema. Ou como diria o ilustre mestre Martin Scorsese: cinema absoluto!



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